16 de setembro de 2021 Suzana Camargo
Até bem pouco tempo, uma subespécie específica da saíra-de-cabeça-azul só tinha sido observada uma única vez, em 1929, pelo naturalista alemão José Blaser, na região da Chapada dos Veadeiros, em Goiás. Pouquíssimo se conhecia sobre a ave, já que havia apenas este indivíduo, coletado há quase 100 anos, e que pertence ao Field Museum of Natural History, de Chicago. O pássaro é considerado uma subespécie, a Stilpnia cyanicollis albotibialis.
Mas o novo encontro com a subespécie
da saíra-de-cabeça-azul aconteceu absolutamente por acaso. No final do ano
passado, em dezembro de 2020, o naturalista Estevão Santos e o biólogo Marcelo
Kuhlmann realizaram uma expedição à Chapada dos Veadeiros para estudar a
interação entre aves e a flora local durante um dos períodos mais propícios
para esse tipo de observação, no início da época chuvosa. “Nessa época há
vários tipos de frutos nas matas do Cerrado e árvores abarrotadas com eles que
se tornam um chamariz para as aves e facilita a observação das espécies”, conta
Santos.
Quando chegaram a uma propriedade, o dono da Fazenda Volta da Serra
falou sobre uma trilha muito grande na área, dentro de uma mata de quase 500
hectares, e integralmente preservada. “Decidimos então explorar a mata e nas
primeiras duas horas de caminhada nos deparamos com a saíra-de-cabeça-azul, na
beira do rio São Miguel, comendo os frutos de uma pixirica (Miconia
minutiflora), espécie de árvore muito comum no Cerrado. “Foi um encontro casual e
fortuito”, diz o naturalista.
A redescoberta dessa subespécie de ave tão misteriosa para a ciência
rendeu um
artigo científico assinado por Santos e Kuhlmann no Bulletin of the British
Ornithologists’ Club (BBOC). O naturalista explica que ela é
considerada tão rara porque ficou muito tempo desaparecida e tem uma área de
ocorrência muito restrita, sendo registrada até os dias de hoje apenas na
Chapada dos Veadeiros.
“Ela é endêmica do Brasil e até agora só foi encontrada nesse local”,
afirma Santos. Ele ressalta, entretanto, que a ave é uma subespécie da Stipnia
cyanicollis, que tem ampla distribuição na Amazônia e nos Andes e é subdividida em
sete subespécies.
A saíra comendo os frutos da pixirica
Tanto macho como fêmea possuem a
mesma cor da plumagem das penas, de um azul extremamente vibrante na cabeça e o
corpo preto com detalhes amarelados e alguns esverdeados na asa.
Como a mata onde a
saíra-de-cabeça-azul foi avistada é muito grande, os pesquisadores suspeitam
que podem haver mais indivíduos. “Pretendemos agora retornar àquela área nesse
mesmo período de chuvas, talvez quando esse mesmo fruto que a vimos consumindo
esteja frutificando, porque aí teremos chance de relocalizar novamente a ave e
se há outros indivíduos na área”, revela o naturalista.
Ele ressalta ainda que é muito
importante que moradores da região e observadores de ave também fiquem atentos
e se mobilizem para tentar observar a subespécie naquela área e assim, obter
mais informações sobre ela.
A redescoberta da subespécie após quase
um século
Fotos: Marcelo Kuhlmann
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